A eletrificação dos automóveis é um caminho sem volta. A maior parte dos fabricantes já fixou datas para o fim da produção de carros a combustão, que variam entre 2030 e 2040. O Brasil, está, no entanto, atolado num ambiente desordenado. O governo não oferece direções e as empresas estão divididas. De um lado, as montadoras com forte estrutura industrial buscam alternativas para prorrogar a produção de carros a combustão, aproveitando a tecnologia do etanol. Já as que defendem que o país siga a tendência mundial decidiram assumir todo o investimento na instalação de infraestrutura de recarga.
As marcas de luxo, que concentram as vendas de carros 100% elétricos, ajudam o consumidor a colocar equipamentos de recarga rápida em casa ou no escritório e têm espalhado pontos em áreas de circulação urbana pública, como shoppings e supermercados. Mas pegar uma estrada em carro elétrico no Brasil ainda é um desafio.
A Volvo Car anuncia hoje um plano para criar corredores de recarga em diversas rodovias. A primeira fase, que absorverá investimento de R$ 10 milhões, envolve rotas que ligam São Paulo a Minas Gerais, Rio, e também ao interior e litoral paulistas. Os trechos dessa fase inicial somarão 3.250 quilômetros e incluem o percurso da capital paulista a cidades como Belo Horizonte, Uberlândia, Baixada Santista e São José do Rio Preto.
Outras quatro fases serão implantadas ao longo do próximo ano em outras partes do país. A empresa sueca também fechou parceria com a Ecorodovias, que administra nove rodovias, para instalação de “socorro” para o consumidor que “esquecer” de carregar a bateria ou tiver errado nos cálculos da autonomia do veículo. Nesse caso, uma carga rápida permitirá que ele percorra mais 50 ou 60 quilômetros, até chegar ao próximo ponto de recarga.
O plano da Volvo, que somará 13 pontos na primeira fase, traz um reforço a outras iniciativas semelhantes. Em 2018, a BMW lançou, em parceria com a companhia de energia EDP, um corredor, com seis pontos de carregamento, na Rodovia Presidente Dutra. Com o apoio da rede Ipiranga, as estações de recarga permitem uma viagem completa em carro elétrico de São Paulo até o Rio.
Também em parceria com a EDP, o grupo Volkswagen – que inclui Audi e Porsche – tem sete pontos instalados em rodovias do Paraná e Rio, três em obras e pretende ampliar a oferta no próximo ano. O objetivo do projeto é cobrir o Estado de São Paulo e parte de Minas Gerais e de Brasília, numa rede de 2,5 mil km.
Por enquanto, o custo da energia fica por conta dos estabelecimentos onde os carregadores são instalados. Nas estradas, são postos de serviços com interesse de que o motorista pare ali para um café ou lanche enquanto recarrega as baterias do veículo. Em seus novos corredores de estrada, a Volvo promete recarga em 40 minutos na maioria dos modelos da marca.
“Não vejo, no curto prazo, no Brasil, a comercialização de energia nesses pontos públicos”, afirma João Oliveira, diretor da Volvo Car no Brasil. No futuro, claro, será diferente. Ninguém vai esperar carregar o veículo de graça assim como hoje não se espera encher o tanque sem pagar pelo combustível, afirma o executivo.
Tanto na Europa, onde a maior parte dos postos de recarga foi criada pelo poder público, como nos Estados Unidos, onde a infraestrutura foi instalada, em grande parte, pela iniciativa privada, a conta de energia é paga pelo usuário por meio de aplicativos no celular ou serviços de assinaturas.
A Volvo se volta para as estradas depois de chegar a mil pontos de carregamento em locais públicos nos centros urbanos. “Nós praticamente já cumprimos com a infraestrutura urbana”, destaca Oliveira. Segundo ele, no caso das cidades, a preocupação é menor porque praticamente 90% dos proprietários de carros elétricos preferem, sempre que possível, carregar as baterias em casa ou no escritório. Como fazem com o celular.
Outras marcas de luxo também têm expandido suas redes nas cidades. Ontem, a Audi anunciou investimento de R$ 20 milhões para instalar postos de recarga rápida em praticamente todas as 42 concessionárias da marca. A marca já conta com 80. Porsche e BMW têm 131 e 300 pontos, respectivamente, e também oferecem o serviço gratuitamente em hotéis, restaurantes e shoppings.
No caso das europeias, a vantagem é que o carregador de uma marca serve no carro das outras. E nenhuma parece se importar de ver o veículo da concorrente sendo abastecido no “seu” posto.
Recentemente, a Porsche também colocou o pé na estrada. Criou uma expedição para o modelo Taycan Cross Turismo, seu último lançamento elétrico. O veículo percorreu mais de 9 mil quilômetros, em 26 dias, de Foz do Iguaçu (PR) até Jericoacoara (CE). Nessa aventura, foram usados mais de 30 pontos de carregamento em diferentes contextos, como rodovias, concessionárias e hotéis.
Por enquanto, o carro 100% elétrico é um artigo de luxo no Brasil. Representa apenas 0,1% das vendas este ano, podendo alcançar 0,2% em 2022. Mas esse mercado tem dobrado a cada ano. A expectativa de Oliveira, que também é presidente da Abeifa, associação que representa os importadores, é de que o mercado de carros 100% elétricos no país chegue 2,3 mil unidades neste ano e algo próximo de 5 mil em 2022.
No caso da Volvo, o processo de eletrificação está acelerado. Em janeiro, a filial brasileira deixou de vender carros a combustão. O próximo passo será parar de vender híbridos e passar a oferecer só 100% elétricos. A mudança começa com o modelo XC40, que responde por 40% das vendas da marca e que a partir de agora será oferecido apenas na versão 100% elétrica. Isso significa que, já em 2022, a participação dos elétricos nas vendas da marca saltará dos 5,6% deste ano para 43%.