A mineração vai ser afetada de três maneiras diferentes pelo avanço do mercado de carros elétricos e o maior risco para o crescimento desse tipo de veículo estará na capacidade de suprimento de minerais críticos. A afirmação é de Rohitesh Dhawan, presidente do Conselho Internacional de Mineração e Metais (ICMM, na sigla em inglês), que visitou no fim do mês passado as operações da Vale no Pará e em Minas Gerais.
“A maior ameaça para o mundo atingir os objetivos de [controle da] mudança climática e [de crescimento dos] veículos elétricos é o suprimento de minerais críticos. Não ter política ou incentivo para o carro elétrico não é risco. O maior risco é não ter minerais críticos”, afirma Dhawan ao Valor. O ICMM, fundado em 2002, é composta por 26 companhias associadas que representam um terço da indústria global de mineração e têm 650 áreas de mineração em mais de 50 países. Como objetivo, o ICMM define padrões para uma “mineração responsável” aplicados a todos os membros.
O executivo citou como exemplo de mudança na demanda global o cobre, cuja produção mundial oscila ao redor de 20 milhões de toneladas por ano, sendo que 4% desse volume é usado pela indústria automobilística. Em 2030, ele destaca, se a taxa de eletrificação de carros crescer como o planejado, 12% do cobre vai ser usado na indústria de veículos elétricos.
Dhawan diz que hoje um carro convencional carrega cerca de 10 quilos de cobre, enquanto um veículo elétrico leva entre 60 e 70 quilos do metal. “Uma forma que vai mudar [a mineração] é mudando a equação de oferta e demanda.”
Ele destaca que outra mudança virá da pressão que empresas automobilísticas deverão exercer por uma mineração mais responsável. “A empresas automobilísticas estão puxando uma demanda por padrões de mineração responsável. BMW, Tesla ou Daimler vão comprar minerais e eles têm que ser produzidos de forma responsável porque o comprador demanda que os carros sejam produzidos sustentavelmente”, frisa. “Nós do ICMM estamos aqui há 20 anos, voluntariamente puxando os padrões. As companhias automobilísticas estão se juntando a nós”, acrescenta.
A terceira forma de mudança virá, na visão de Dhawan, das oportunidades para a integração na indústria, inclusive com parcerias com fabricantes de baterias. O executivo não descarta a possibilidade de haver fusões e aquisições.
Em meio a esse cenário, Dhawan alerta para o comportamento dos preços e frisa que a tendência é que eles subam sempre que houver a preocupação de suprimento insuficiente. Ele lembra o caso do lítio, fundamental para as baterias elétricas, e explica que hoje a produção global anual gira em torno de 500 mil toneladas. Em 2023, a estimativa é que a demanda anual flutue entre 2 milhões e 2,2 milhões de toneladas. “Como resultado, o preço do lítio sobe. De bom, vem o fato de precisarmos descobrir novas formas de produzir lítio”, diz.
Ao falar do comportamento esperado para os preços das commodities, Dhawan também projeta um horizonte de longo prazo saudável para o minério de ferro. Ele ressalta que, se a demanda por aço crescer 2,5% por ano, o consumo do produto vai dobrar até 2050, impulsionando o minério. “[Vejo o] Futuro extremamente saudável, algo que o mercado não aprecia porque está obcecado com o curto prazo”, diz, lembrando que há a necessidade de 100 milhões de toneladas anuais de nova capacidade de minério de ferro apenas para “manter a oferta estável”.
O executivo também destaca que a indústria do minério de ferro ajudará a descarbonizar seus clientes siderúrgicos através de três maneiras principais: fornecendo um minério de maior qualidade, o que reduz entre 20% e 25% as emissões de CO2 na produção de aço; com novos produtos, como o briquete desenvolvido pela Vale, que reduz as emissões das siderúrgicas em 10%; e através do co-investimento com as siderúrgicas em tecnologias inovadoras.
Dhawan também citou as mudanças ocorridas na indústria de mineração depois dos rompimentos das barragens da Samarco, em Mariana, e da Vale, em Brumadinho. Segundo ele, a indústria tomou para si a responsabilidade coletiva para a segurança das barragens. “Quando Mariana aconteceu, a indústria não respondeu coletivamente da maneira que deveria. Foi visto como uma questão de uma empresa. Agora sabemos que temos que ter cuidado extremo e operar com a maior segurança possível. Esse sentimento coletivo só aconteceu depois de Brumadinho”, afirma.
Dhawan explica que o resultado foi o desenvolvimento do Global Industry Standard in Tailings Management (GISTM), ou Padrão Global da Indústria em Gerenciamento de Barragens, em tradução livre, que mudou o gerenciamento das barragens de uma questão individual para uma responsabilidade coletiva. “O GISTM dá de forma clara e explícita referências como os aspectos sociais devem ser considerados no design e gerenciamento de barragens no futuro.”